De – William Shakespeare
Tradução – Fernando Villas‐Boas
Encenação e dramaturgia – Luís Araújo
Assistência de encenação – Manuel Tur
Cenografia – F. Ribeiro
Desenho de luz – Nuno Meira
Vídeo – Joana Soares, Nuno Marques
Com a colaboração de – Tiago Guedes
Sonoplastia – Pedro Augusto
Figurinos – Nelson Vieira
Apoio dramatúrgico – Miguel Cruz
Mistura de vídeo em cena – Fábio Coelho, Fernando Costa Fotografia e design – Sara Pazos
Direção de produção – José Luís Ferreira
Interpretação – Ana Brandão,
Ana Margarida Mendes, Ana Pinheiro, Carolina Rocha, Diana Sá, Gonçalo Fonseca, Jorge Mota, Luís Araújo, Maria, Inês Peixoto, Miguel Damião, Nuno Preto, Pedro Almendra, Rafaela Sá
Com a participação de – Maria Leite
Realização – Luís Araújo, Tiago Guedes
Assistência de realização – Joana Soares, Manuel Tur
Direção de fotografia – Nuno Marques
Direção de som – Sérgio Silva
Perche – Vasco Pucarinho, Pedro Marinho
Anotação – Miguel Cruz
Assistência de produção – Ana Fernandes, Ana Margarida Mendes, Ana Pinheiro Montagem – Joana Soares
Cor – Nuno Marques
Mistura de som – Pedro Augusto
Coprodução – Ao Cabo Teatro, São Luiz Teatro Municipal, TNSJ
Entre a execução de uma coisa aterradora e o primeiro movimento, o intervalo é como um fantasma ou um sonho horrível.
Bruto, Acto II, cena 1
A Tragédia de Júlio César é uma peça sobre pessoas que cometem erros, erros custosos, para si próprios e para o seu país. Ninguém nesta peça escapa a interpretações erradas, decisões erradas e erros de cálculo. Ser governado por César significa a total submissão a um autocrata implacável, capaz dos piores castigos. Porém, ser governado pelos homens que o matam significa a total sujeição às vontades de homens corruptos e auto‐centrados, cujo slogan “liberdade” se refere exclusivamente à própria liberdade de acção e à ausência de consequências para os seus actos. Imediatamente depois de assassinarem César, Cássio diz: “Por quantos séculos irá esta nossa cena heróica ser representada, em países por nascer e línguas ainda ignoradas.”
Este jogo auto‐referencial remete‐nos para os assassínios que marcaram a nossa história política: Marat, Lincoln, Trotsky, Mahatma e Indira Gandhi, Kennedy, Martin Luther King, Anwar Al Sadat, Saddam Hussein, Kadafi, entre tantos outros. Continuamos ainda a sacrificar inutilmente pessoas no altar das ideologias. Vezes sem conta, homens de slogans e ambição seduzem e iludem milhões de pessoas com retórica hipócrita. Repetidamente, violência gera mais violência. Ciclicamente, somos levados a achar que os fins justificam os meios. Talvez por isso esta peça aparente ser tão radicalmente irónica e me seja tão difícil levar as suas personagens a sério: vemos energias a serem viradas contra si próprias, quedas directamente relacionadas com aspirações e limitações enfatizadas por potencialidades.
Em A Coragem da Verdade, Michel Foucault debruça‐se sobre a importância do falar em público e discorre sobre a parrésia, que designa a coragem de se dizer a verdade, de se falar com franqueza, expor tudo. Contudo, nesta peça, o falar não é simplesmente um modo de tornar a personagem visível.
O discurso é a própria acção interior das personagens, os seus conflitos e as suas escolhas. Perante isto, o leitor/ espectador vê‐se obrigado a tecer a sua própria narrativa, não só pelo que é dito em público, mas sobretudo pelo que é feito em privado.
Foram estas possibilidades que me atiraram para este texto: a de um teatro vazio de actores, a da cisão na forma como se acede ao que é público e ao que é privado, a da exposição do que
é feito por uns enquanto acontece o que é dito por outros, oscilando entre a relevância do que acontece em palco e do que acontece em bastidores. Traça‐se assim uma ligação directa entre o real e o ficcionado, o actor e a personagem, a política e a cultura.
A apropriação do bastidor do teatro é também uma forma de falar de nós usando o enfrentamento com o outro, uma tentativa de encontrar os recursos possíveis de aproximação e de distanciamento entre as partes.
Precisamos – eu preciso – de tempo para fazer sentido do mundo e o problema com o tempo é sempre a aparente falta dele. E, talvez por causa disso, transformamos a complexidade do mundo numa sofreguidão binária.
Hegel disse que a história se repete, Marx acrescentou que se repetia a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa, e eu dou‐me conta de que, neste momento, é já um meme. Há mais morte na história do que carne no corpo.
É possível que aprenda, é possível que ganhe, é provável que perca.





































